A alocação dinâmica dos talentos no futuro do trabalho
Os modelos de alocação dinâmica combinam talentos e habilidades escassas com trabalho de alta prioridade, melhoram o desenvolvimento de pessoas e aumentam a capacidade de resposta dos negócios.
A abordagem não é nada nova e a pandemia apenas reforçou a sua importância.
A pandemia interrompeu a maioria dos modelos de negócios e as organizações agora lutam para aprender rápido como fazer as equipes híbridas funcionarem melhor, descobrir quais as novas habilidades necessárias e como será a força de trabalho do futuro.
Por Joel Solon Farias Azevedo
Fundador da ProValore
É cada vez mais crítico o desafio permanente de como aplicar os raros talentos existentes nas oportunidades de maior valor dentro de uma organização.
A pandemia aumentou a pressão sobre as organizações para responder a algumas tendências da gestão de talentos no médio e longo prazo, cada vez mais prementes:
1. As habilidades críticas demandadas são cada vez mais escassas, agravadas pela digitalização e automação;
2. O tempo de resposta das organizações ainda é muito lento e não atende à velocidade da mudança necessária;
3. É essencial para toda e qualquer organização responder rapidamente e se adaptar às mudanças e exigências do ambiente externo;
4. A capacidade organizacional de operar com orientação à mudança e em condições incertas é essencial; e
5. A flexibilidade e agilidade agora são a regra e questão de sobrevivência para todas as organizações, inclusive as públicas e as que operam em monopólio.
Assim, o contínuo desenvolvimento e a requalificação auxiliam na resposta aos desafios, principalmente porque a escassez e talentos tende a se agravar no médio e longo prazo.
Ao mesmo tempo, as organizações também precisam melhorar e muito na aplicação dos talentos existentes nas pessoas, uma vez que a qualidade da alocação ainda é muito ruim, o que na prática promove a evasão dos melhores que não foram aproveitados e a manutenção dos comuns, com nivelamento por baixo.
Para fazer essa mudança, organizações com visão de futuro estão escolhendo modelos de alocação dinâmica da força de trabalho, que criam equipes de recursos que podem ser implantados de forma flexível e sob demanda. Essas equipes são formadas com base na similaridade de habilidades, em vez da similaridade de funções de negócios, tornando mais fácil para as organizações acessarem as habilidades certas quando necessário.
O gerenciamento das equipes de recursos realiza a aplicação dos colaboradores em processos ou projetos em função da maior prioridade estratégica para a organização e na combinação de habilidades necessárias para concluí-las.
Um modelo de alocação dinâmica da força de trabalho pode ser uma resposta organizacional eficaz para todos os desafios da gestão de talentos.
Ao alocar os talentos escassos para o trabalho de maior prioridade e valor em toda a organização, evita-se a ineficiência conhecida de acumular com exclusividade os talentos e as pérolas com habilidades valiosas apenas algumas unidades, enquanto fazem falta em quase todas as outras unidades.
Ao criar mecanismos para realocar e redistribuir talentos com base nas prioridades, sempre mutantes, as organizações estarão bem-posicionadas para responder rapidamente a mudanças externas, incluindo as mudanças na demanda de produtos e serviços e nos requisitos dos clientes.
Ao formar equipes flexíveis, as funções podem ser adaptadas para melhor corresponder às habilidades e ao trabalho a ser realizado, com as pessoas desempenhando funções diferentes em equipes diferentes, conforme necessário.
Mudar a maneira de alocar pessoas da antiga lotação fixa para a nova alocação dinâmica não é uma tarefa simples, ao contrário.
Ela requer mudanças significativas nos processos de gestão e maiores ainda cultura organizacional.
No entanto, a alocação dinâmica pode ser a solução para melhorar a velocidade e a capacidade de resposta organizacional, a liderança de pessoas e o desenvolvimento de talentos.
Os benefícios da flexibilidade na alocação
O modelo de alocação dinâmica de pessoas não é novo. Organizações projetizadas operam assim. Nelas, as pessoas ESTÃO temporariamente alocadas em projetos e não em funções fixas. Elas não SÃO de uma ou outra área funcional. Elas NÃO são recursos exclusivos de uma ou outra unidade!
A alocação dinâmica temporária e parcial de pessoas e equipes com determinadas habilidades sempre se aplicou ao gerenciamento de projetos, em função dos requisitos específicos de habilidades em curtos espaços de tempo e das repriorizações normais na gestão de portfólios de projetos.
Mas, fora da execução de projetos, a maioria das organizações ainda opera com alocação exclusiva dos seus recursos humanos em unidades funcionais e estanques, com a hierarquia e a estruturação verticalizada da administração científica.
A alocação dinâmica de talentos aumenta exponencialmente os resultados
Num modelo dinâmico de alocação, as pessoas que antes eram designadas em tempo integral para uma função com atividades restritas agora podem fazer parte de equipes flexíveis alocadas de forma dinâmica às atividades que mais precisam de suas habilidades.
A condição para isso é a avaliação de competências nas quais a pessoa pode atuar em toda a organização.
Cada equipe de recursos é liderada por um “gerente de recursos estratégicos” que é responsável por garantir que a equipe tenha as habilidades e a experiência exigidas pela organização. A função inclui planejamento da força de trabalho, aprendizado e desenvolvimento e planejamento de sucessão.
A importância de organizar os talentos em grupos flexíveis de competências visa garantir o foco no rápido desenvolvimento de lacunas presentes e no desenvolvimento das competências requeridas no futuro.
Quando o talento é organizado por expertise profissional/domínio de competências, ele naturalmente cria a necessidade de uma nova função — a de alguém que possa liderar essa equipe e impulsionar o desenvolvimento de carreira e o aprendizado em todo o grupo.
Um bom exemplo é o gestor de determinada área processual em uma central de processamento de serviços.
Este gerente de recursos estratégicos ou gestor de um banco de recursos ou competências atua também como um curador que precisa disseminar o conhecimento para toda a organização, como fator crítico de sucesso em um ambiente de mudança acelerada.
A jornada da implantação flexível e as questões a serem consideradas
Antes de avançar para um modelo de recursos flexíveis, as organizações devem buscar respostas para algumas perguntas fundamentais:
1. Que tipos de trabalho se beneficiariam da alocação dinâmica da força de trabalho?
Um modelo de alocação dinâmica é mais apropriado para trabalhos de maior complexidade e que exigem habilidades e talentos escassos.
Um bom exemplo em um tribunal é o de assessores jurídicos superespecialistas em direito ambiental, atuando em uma fila única com todos os processos de direito ambiental de todo o estado.
A alocação dinâmica da força de trabalho não é adequada para todas as funções e atividades.
Uma equipe fixa à moda antiga, por exemplo, ainda faz mais sentido para trabalhos que envolvem tarefas muito repetitivas e previsíveis.
Outro exemplo também em um tribunal é a da assessoria jurídica que atua nos processos de compras.
Observe que a alocação dinâmica NÃO é adequada para todas as funções e atividades!
2. Quais os tipos de talentos devem ser organizados em equipes flexíveis ou pools de recursos?
Para a maioria das organizações, organizar e alocar seus recursos humanos de forma dinâmica a partir dos seus talentos e tipos de habilidades em vez de funções, regiões ou áreas de negócios é uma mudança enorme, quase uma revolução.
O trabalho passa por reestruturar as famílias de cargos existentes e os seus requisitos de competências e reestruturar o processo de avaliação de competências e os seus níveis de domínio para então construir programas de desenvolvimento de competências no curto, médio e longo prazo.
3. Como os talentos e as competências devem ser alocados para a otimização de resultados?
Uma vez definidos os grupos de talentos e competências, e próxima etapa crítica passa a ser as diferentes estratégias de alocação.
São várias as estratégias e formas de alocação de talentos, que não se limitam a:
1. Alocação temporária em filas de trabalho para toda a organização
2. Alocação temporária em picos de demanda em outras unidades
3. Alocação temporária em projetos
4. Alocação em funções de consultoria, assessoria e auditoria
5. Alocação em centros de excelência
1. Alocação temporária em filas de trabalho para toda a organização
São unidades que centralizam o atendimento e o processamento de operações de suporte que operam com filas de trabalho por competências que abrangem todo o alcance da organização, até mesmo o país todo.
Também, normalmente, existe uma unidade física com a coordenação, mas a maioria das pessoas operam em regime de trabalho remoto a partir de suas casas ou de postos de trabalho compartilhados.
Um exemplo é a fila única de análise e tratamento de processos de aposentadoria do INSS, na qual atuam pessoas de todo o país.
2. Alocação temporária em picos de demanda em outras unidades
Equipes de trabalho adicionais são necessárias para atuar de forma pontual, contingencial ou em picos de demanda para uma unidade ou um grupo de unidades.
Tais grupos atuam, de regra, em regime de trabalho remoto com a força de trabalho distribuída e, somente na exceção, atuam de forma presencial nas unidades atendidas.
3. Alocação em projetos
Na alocação em projetos, o colaborador é alocado temporariamente em uma equipe de projetos e recebe uma função claramente definida e atribuições e entregas também definidas, com prazo de entrega e nível de qualidade negociados.
Enquanto alocado neste projeto, o seu trabalho diário é gerenciado pelo líder do projeto no qual está alocado, e não pelo seu líder de origem.
Um exemplo simples ocorre em organizações projetizadas como construtoras, quando os recursos são alocados nas obras.
4. Alocação em funções de consultoria, assessoria e auditoria
A alocação em consultoria e assessoramento é diferente. Nela, o consultor/assessor pode auxiliar várias equipes e várias unidades ao mesmo tempo, com alocação parcial.
Consultores são tipicamente líderes seniores em funções corporativas, e são gerenciados também nos projetos e processos nos quais atuam, mas principalmente pelo líder na equipe de origem.
Um exemplo simples são as auditorias e consultorias de desempenho.
São profissionais de grande conhecimento, expertise e experiencia no domínio do negócio e com a capacidade de trabalhar simultaneamente em vários projetos e com várias equipes.
A função principal é fornecer conhecimento e expertise direcionada à solução de problemas conhecidos.
5. Alocação em centros de excelência
O centro de excelência tem o nível mais alto de requisitos de competências e de talentos.
Nele precisam ser combinados a aplicação dos profissionais de nível sênior com grande conhecimento, expertise e domínio do negócio da organização com talentos mais jovens, especialistas e generalistas realmente orientados à mudança e à inovação e acostumados com pesquisa, experimentação e construção de novas soluções.
4. Qual é o mecanismo para tomar decisões de alocação e distribuição de pessoal?
Os modelos são os mais variados e em todos há compensações e balanceamento entre remuneração fixa e variável, requisitos de competências com níveis de domínio, trilhas de desenvolvimento profissional, cruzamento de disponibilidade de competências com requisito da função, prioridades estratégicas e carga de trabalho versus a capacidade disponível.
Fatores críticos de sucesso
Fazer com que um modelo flexível e dinâmico de alocação funcione vai muito além da definição de funções com requisitos de competências e níveis alinhada com a execução de programas de avaliação confirmem a prontidão presente, definam a prontidão futura e desenvolvam as pessoas de forma continuada em trilhas dinâmicas de construção do conhecimento capaz de manter a organização atualizada e capaz de alcançar os seus objetivos.
Não é simples, e significa intervir em vários processos estratégicos e de pessoas da organização.
A estratégia pode fracassar, por exemplo, quando não há compensações no nível da organização e no nível das pessoas para a priorização da alocação em atividades mais críticas aos resultados.
A demanda por talentos diferenciados é muito grande em toda a organização e, ao mesmo tempo, há um excesso de demandas concorrentes que não podem ser atendidas ao mesmo tempo.
Outra questão é a importância do desenvolvimento das pessoas e dos talentos em um modelo dinâmico. Como a alocação é parcial e temporária, não existe a responsabilidade da formação e atualização das pessoas na unidade de destino, mas sim na origem, que precisa assumir este papel e garantir que as pessoas estejam atualizadas em seus perfis de competências.
Compreendendo e priorizando o trabalho
O ponto de partida é sempre o acordo de trabalho. Ele precisa ser bem claro quanto ao requisito de competências, nível de complexidade das atividades a serem realizadas, metas quantitativas e qualitativas de desempenho e reconhecimento, meritocracia e remuneração e benefícios variáveis.
Já a distribuição da força de trabalho em função da priorização estratégica e das repriorizações dinâmicas da gestão de riscos e resultados dos portfólios de processos e projetos precisa ser assumida e executada em alto nível na organização, preferencialmente pelos mesmos comitês com poder para a gestão dos portfolios.
Tais priorizações e as decisões de alocação decorrentes variam muito de organização para organização. Existem casos de repriorização e realocação semanal em portfólios de projetos estratégicos.
O ideal é que o intervalo de tempo não seja nem muito curto e nem muito grande e que não seja maior que o trimestre, por exemplo.
A importância do alinhamento de metas e prioridades
Equipes e pessoas com alocação dinâmica e temporária precisam ter clareza sobre objetivos e metas coletivos e individuais. Para isto devem usar indicadores claros de resultado e de esforço e, por último, precisam compartilhar objetivos de sucesso com consequências coletivas e individuais em termos de reconhecimento, meritocracia e remuneração e benefícios variáveis.
É muito importante também que os papeis sejam bem definidos.
As atribuições e responsabilidades de cada membro da equipe devem ser bem comunicadas para garantir transparência em toda a equipe.
Deve também haver expectativas consistentes quanto às promoções e a evolução dos métodos de trabalho.
E precisa garantir às pessoas a mobilidade horizontal e vertical entre programas e projetos.
Criação de responsabilidades claras de liderança de pessoas
Um modelo flexível e dinâmico precisa de uma nova liderança com o perfil de gerente de projeto e não de gerente funcional.
O gerente funcional segue existindo nos processos e nas unidades funcionais.
Mas o novo líder necessário à alocação dinâmica é bem diferente. Ele é um garimpeiro e um desenvolvedor de talentos que precisa apoiar e facilitar o desenvolvimento de pessoas diferenciadas e com um nível de exigência de formação e desenvolvimento bem maior do que as pessoas comuns alocadas nos processos de trabalho.
No geral, vemos cinco funções distintas que são necessárias para tornar a implantação flexível um sucesso, cada uma delas com responsabilidades diferentes relacionadas ao trabalho e à gestão de pessoas.
Novos papéis são necessários para a alocação dinâmica e flexível da força de trabalho e dos talentos
No maior nível, precisamos de um líder sênior com a responsabilidade de alinhar as demandas estratégicas em ordem de prioridade e gerenciar e distribuir as equipes de forma dinâmica e tempestiva as atividades, nos processos e nos projetos.
No segundo nível temos o gerente de projetos, já tradicional na organização projetizada. Ele responde pelo gerenciamento do trabalho e das prioridades, pela facilitação e apoio às pessoas e pela formação continuada e avaliação e feedback em relação aos resultados entregues.
No terceiro nível, temos um gerente de desenvolvimento com a responsabilidade de gestão de carreira, desenvolvimento e de desempenho, que não é mais medido em apenas uma unidade, mas nas várias unidades e filas de trabalho em que a pessoa atua durante o ciclo avaliativo.
No quarto nível, temos o gestor de cada competência ou uma habilidade específica que justifique a existência de uma função ou de uma fila de trabalho.
Este líder responde pelo desenvolvimento e pela prontidão de determinada competência. Ele precisa garantir que as pessoas tenham a competência necessária para a execução das funções com proficiência.
No quinto nível, temos o recrutador de talentos, o garimpeiro. Ele pode conhecer profundamente o perfil requerido para cada competência nas pessoas, as trilhas e programas de desenvolvimento e as prioridades estratégicas da organização para garantir a qualidade da alocação.
Conclusão
No mundo tradicional do trabalho e nas organizações hierárquicas e funcionais, líderes e colaboradores estão acostumados a cumprir suas obrigações no mesmo lugar e com as mesmas pessoas. Quer dizer, recursos exclusivos para cada unidade funcional, que podem sobrar em uma e faltar em outra, principalmente em termos de conhecimento.
O modelo de alocação dinâmica exige líderes diferentes e colaboradores também com perfis diferentes.
Aquele desenvolvimento gerencial que formava gerentes de linha funcionais para a hierarquia e para a burocracia não serve mais. O mesmo desenvolvimento gerencial que não formava gerente de projetos e, quando precisava, ou garimpava e os descobria por acaso, ou fazia novo processo seletivo externo.
As organizações estão cientes de que o modelos tradicionais de gestão de pessoas não servem para a gestão de talentos.
E que talentos são cada vez mais raros, cada vez mais caros e cada vez mais decisivos.
As organizações precisam captar e formar pessoas para operar com flexibilidade e combinar e aplicar competências para atender aos objetivos externos de forma tempestiva.
O modelo de alocação dinâmica e flexível é uma das soluções para um ambiente que exige flexibilidade e agilidade na resposta num momento de transformação digital, de mudanças aceleradas e déficit ainda maior de talentos.
Bibliografia
Inspirado e adaptado do original The key role of dynamic talent allocation in shaping the future of work, da McKinsey, Por Elizabeth Foote, Bryan Hancock, Bárbara Jeffery, Rob Malan, disponível em https://www.mckinsey.com/capabilities/people-and-organizational-performance/our-insights/the-key-role-of-dynamic-talent-allocation-in-shaping-the-future-of-work
Reskilling: a arte de desaprender e aprender de novo, por Grupo Selpe, disponível em https://www.gruposelpe.com.br/blog/reskilling/
Evasão de talentos, por Cesar Augusto De Ré, disponível no Linkedin em https://www.linkedin.com/pulse/evas%C3%A3o-de-talentos-cesar-augusto-de-r%C3%A9/
Punição pelo bom desempenho, por Joel Solon Farias Azevedo, disponível em https://provalore.com.br/punicao-pelo-bom-desempenho/
Cursos relacionados:
Desenvolvimento Gerencial
Liderança e Gestão de Pessoas
Negociação e Gestão de Conflitos
Governança da Gestão de Pessoas
Dimensionamento da Força de Trabalho – DFT
Meritocracia e Reconhecimento
Gestão por Competências
Conte com a ProValore para melhorar os processos de gestão da sua organização
Cadastre-se em nosso informativo e receba o eBook Planejamento Estratégico para a Transformação em 2025