Execução: como fazer a estratégia funcionar
por Alessandra Assad em Administradores.com.br
“Fracasso ao planejar é o mesmo que planejar o fracasso”. Foi com esta ideia que Lawrence Hrebiniak (autor do livro Execução – Fazendo a Estratégia Funcionar – Editora Bookman), referência internacional nas áreas de formulação e execução de estratégias competitivas e design organizacional e professor da Wharton School, da University of Pennsylvania começou sua palestra no Special Management Program “Fazendo a Estratégia Funcionar – O Caminho para uma execução bem-sucedida”, da HSM, em São Paulo, semana passada. Ele defendeu veementemente a idéia de que tudo começa com a estratégia. Fazer o plano funcionar, é um desafio ainda maior do que criar o plano.
Hrebiniak explicou que a execução da estratégia não constitui uma parte comum do trabalho administrativo, ela define a essência desse trabalho. “A execução exige comprometimento e paixão pelos resultados, independente do nível da administração”. O professor enfatizou que ainda sabe-se muito mais sobre planejamento do que sobre realização, sobre a criação da estratégia, do que sobre o seu funcionamento real. E compara a execução da estratégia com uma expressão popular nos círculos de TI: “Lixo dentro, lixo fora”. Os planos ruins e mal concebidos geram resultados ruins. “Os gerentes não podem executar um plano confuso, desfocado ou mal gerado. A estratégia conduz ou afeta um grande negócio, devendo ser desenvolvida com cuidado”. Logo, estratégias fracas resultam em planos fracos de execução. “Uma estratégia ruim gera uma execução deficiente. Estratégias mal-concebidas praticamente garantem resultados deficientes na execução”. E execução começa com uma boa estratégia.
A importância do planejamento
Um bom planejamento auxilia o processo de execução. Da mesma forma, um planejamento insuficiente gera uma implementação insuficiente. “Alguns gestores podem até argumentar que uma boa execução pode compensar uma má estratégia ou um planejamento inadequado. A experiência que tenho, geralmente prova o contrário. A execução de uma má estratégia geralmente é uma proposta que não alcançará o sucesso. Um planejamento insuficiente normalmente conduz o processo de execução para mares conturbados que se tornam cada vez mais difíceis de navegar”.
Os planos de execução no nível corporativo irão a pique ou não darão certo se não receberem suporte corporativo. Para o palestrante, é impossível discutir a execução até que se tenha alguma coisa para executar. Porém, quando a ‘elite’ planeja e vê a execução como algo que está abaixo dela, diminuindo a sua dignidade enquanto alta gerência, a implementação bem-sucedida está comprometida. “A execução não é algo com o qual podemos nos preocupar mais tarde”, alerta.
Estratégias vagas não podem ser facilmente transformadas nos objetivos ou na métrica mensurável tão importantes para a execução. Planos corporativos e empresariais imprecisos inibem a integração dos objetivos, das atividades e das estratégias entre os níveis corporativo e empresarial. “Os administradores que sabem algo da execução da estratégia têm fortes probabilidades de desenvolver uma vantagem competitiva com relação aos que não sabem”.
Obstáculos
Se execução é essencial para o sucesso, por que um número maior de organizações não desenvolve uma abordagem disciplinada em relação a ela? Por que as empresas não dedicam mais tempo desenvolvendo e aperfeiçoando processos que as ajudem a obter resultados estratégicos importantes? E por que muitas empresas não conseguem executar ou implementar bem as estratégias e colher os frutos desses esforços? “A resposta é muito simples. A execução é extremamente difícil. Há obstáculos e dificuldades que se atravessam no processo de execução e comprometem seriamente a implementação da estratégia”, explica Hrebiniak. Entre os obstáculos citados por ele, estão:
– A falta de integração entre o planejamento corporativo e o planejamento dos negócios – Sabe-se muito mais sobre planejamento do que sobre realização, sobre a criação de estratégia do que sobre o seu funcionamento real.
– Os administradores são treinados para planejar, não para executar – Aprende-se a execução na “escola da vida real”, e os caminhos que levam a resultados bem-sucedidos vêm acompanhados de erros e frustrações.
– Deixa-se que “serviçais” cuidem da execução – Todos os gestores são responsáveis por uma execução bem-sucedida, e não se trata de uma tarefa de nível inferior.
– Interdependência entre planejamento e execução – Quanto maior for a interação entre os “fazedores” e os “planejadores” e de suas tarefas, maior será a probabilidade do sucesso da execução.
– A execução demora mais que a formulação – A execução sempre leva tempo e impõe pressão sobre a gerência em busca de resultados. Este tempo aumenta a probabilidade de aparecer novos problemas.
– A execução é um processo, e não uma ação ou uma etapa – Exige muita atenção para funcionar. Os gerentes que buscam uma solução rápida para os problemas de execução vão fracassar nas tentativas de fazer a estratégia funcionar.
– A execução envolve mais pessoas que a formulação da estratégia – Quanto maior for o número de pessoas envolvidas, maior será o desafio que a execução efetiva da estratégia apresentará.
Oportunidades
É fundamental estabelecer que “as pessoas certas fiquem no ônibus, e as erradas desçam logo. Mas é igualmente importante saber para onde o ônibus está indo e por quê”. Na opinião de Hrebiniak, conhecer os perigos ou oportunidades da execução é algo necessário, mas não suficiente. Para que uma execução bem-sucedida aconteça, os administradores precisam de um modelo ou de um conjunto de diretrizes que apresentem todo o processo e as relações entre as principais decisões ou ações, uma vez que sem diretrizes, a execução torna-se uma questão confusa e atropelada.
Segundo Hrebiniak, a estratégia define a arena (clientes, mercados, tecnologias, produtos, logística) na qual o jogo da execução será realizado. Já a execução constitui um esforço vazio sem a orientação da estratégia e dos objetivos de curto prazo relacionados à ela. Fazer a estratégia funcionar requer mais que uma série de qualidades sólidas de gestão, e os motivos pelos quais a execução é ou não bem-sucedida só podem ser entendidos caso se tenha um indicador com o qual comparar e analisar as decisões e ações de execução.
Na avaliação do especialista, os ingredientes-chave que definem a execução da estratégia incluem decisões sobre estratégia, estrutura, coordenação, compartilhamento de informações, incentivos e controles. Essas decisões ocorrem dentro de um contexto organizacional, no qual estão incluídos poder, cultura, liderança e a capacidade de administrar alterações. “É necessário compreender as interações entre as decisões de execução-chave e as forças contextuais para compreender como fazer funcionar a estratégia”, ressaltou.
Entre os erros e problemas comuns de implementação, Hrebiniak destacou não haver um modelo ou plano de implementação, estratégia falha ou planejamento estratégico inadequado, separação disfuncional entre planejamento e realização, não levar em conta a estrutura de poder na organização, não se chegar a um acordo nos processos de formulação e de implementação, falta de entendimento da estrutura organizacional e do papel desta na implementação da estratégia, má coordenação e integração, incentivos inapropriados: recompensar as coisas erradas e incapacidade de gerenciar mudanças.
Vantagem competitiva
“É preciso criar e manter a vantagem competitiva”. Com esta afirmação, e acreditando que a execução não é resultado de uma decisão ou ação únicas, e que resulta de uma série de decisões ou ações integradas ao longo do tempo, Hrebiniak explicou o porquê de uma execução convincente conferir vantagem competitiva às empresas, citando o exemplo da Companhia Aérea Southwest, que faz muitas coisas diferentes da maioria das companhias aéreas de grande porte. A empresa não tem transferência de bagagem, não serve refeições, não emite cartões de embarque, usa um único tipo de aeronave (reduzindo os custos de treinamento e manutenção) e estimula uma rápida passagem pelo portão de embarque, desenvolvendo características próprias e criando uma série de atividades para apoiar sua estratégia de baixo custo. Outras companhias aéreas se sentiram pressionadas a copiar essa estratégia, já que estão fazendo tudo o que a Southwest não faz. Elas estão comprometidas com rotinas e métodos diferentes, e copiar as atividades de execução da Southwest envolveria compensações difíceis, tarefas diferentes e grandes mudanças, o que complica o problema de desenvolver e integrar novos processos ou atividades de execução. “Isso não significa dizer que os competidores não podem copiá-la, o que já vem acontecendo. Esse argumento só comprova que é extremamente complicado fazer imitações desse tipo”, ressalta.
E os benefícios podem ser mensurados rapidamente: “O produto ou serviço deixa de ser facilmente imitável, fica caro fazer negócios com outra empresa, a empresa fica protegida: a intensidade da competição diminui, os lucros aumentam, a implementação ou execução torna-se mais fácil”, concluiu.
Fatos e equívocos
É fato que: barreiras ao ingresso no mercado, bem como o poder organizacional, favorecem a execução da estratégia; é extremamente difícil executar uma estratégia de diferenciação num setor competitivo com comoditização crescente; interpretar erroneamente as capacitações e intenções dos concorrentes, ou sua capacidade de reagir a nossas iniciativas estratégicas, pode prejudicar a implementação bem-sucedida da nossa estratégia; o que for fácil imitar prejudica ou destrói os esforços para executar a estratégia. E chama atenção para alguns equívocos que são muito comuns nas organizações:
– Pressupor equivocadamente uma competência essencial ao formular e implementar a estratégia pode provocar problemas graves.
– Interpretar erroneamente os custos que o cliente teria para transferir seus negócios para outra empresa pode dificultar ou impedir a execução da estratégia.
– Confiar numa estratégia de custos baixos e preços vantajosos será desastroso se os concorrentes tiverem uma posição de custos mais favorável.
– A má monitoração das mudanças do setor e das forças competitivas e a má adaptação (inércia) podem complicar a execução da estratégia.
– Para executar com sucesso uma estratégia, a empresa tem de dominar as tendências do setor, as ações dos concorrentes e as próprias capacitações num mercado em constante transformação.
O professor lembrou do caso da Dell, quando lançou o seu “modelo” vendendo PC’s diretamente para especialistas e clientes corporativos, evitando revendedores e varejistas. O pressuposto era que os clientes da IBM tinham altos custos de substituição. Os baixos custos de substituição permitiram que a Dell ampliasse a sua participação de mercado. A incapacidade da IBM, da HP e da Compaq de ir direto ao ponto e imitar a Dell devido ao comprometimento assumido com um modelo empresarial que envolvia varejista e revendedores facilitou a capacidade da Dell de por a sua estratégia em prática. Assim, a Dell foi a empresa que se beneficiou com os custos de substituição, o que a ajudou a facilitar a execução e obter resultados positivos de desempenho.
Qualquer que seja a estratégia – baixo custo, diferenciação do produto, serviços inovadores -, ela só funcionará se for “perfeitamente definida, claramente transmitida e bem compreendida pelos funcionários, clientes, parceiros e investidores”.
O professor afirma que é necessário “traduzir” a estratégia, e a melhor forma de fazer isso é levando em consideração que o trabalho das pessoas dos escalões mais baixos deve ser consistente com as metas estratégicas; o foco no curto prazo e as atitudes imediatistas têm de ser consistentes com as necessidades de longo prazo; é necessário determinar os objetivos e o desempenho de curto prazo certos.
Mudanças eficazes
Uma execução bem-sucedida requer uma gestão de mudança eficaz. Mas, por que gerenciar mudanças é sempre uma questão potencialmente perturbadora, apesar da aprendizagem e dos insights que aparentemente foram acumulados ao longo do tempo?, indagou o palestrante. Primeiro, porque gerenciar mudanças estratégicas é algo terrivelmente complexo e difícil. O número de fatores e obstáculos interdependentes que afetam a execução certamente aumentam a complexidade que os líderes precisam enfrentar ao fazer seus esforços de mudança. Em segundo lugar, a ênfase em programas ou processos de execução da estratégia não tem se centrado o suficiente em certos aspectos da gestão de mudanças que afetam diretamente os resultados da execução.
Ele explicou que a relação entre o tamanho da mudança e o tempo disponível para a mudança determina como a mudança é executada, os custos e benefícios da mudança e o prognóstico de sucesso. “Saber como o tamanho e a velocidade da mudança afetam e execução da mudança e os custos e benefícios de diferentes abordagens à mudança é absolutamente essencial à gestão de mudanças e a uma execução eficaz”.
Baseado nesses pontos, o professor construiu um modelo de mudança e execução que é útil para os gerentes que estão preocupados em fazer a estratégia funcionar. Os componentes do modelo são:
· O tamanho de um problema – o conteúdo da mudança deve refletir e reagir ao tamanho de uma ameaça ou oportunidade. O tamanho importa quando descreve problemas com os quais a gerência deve lidar ao gerenciar mudanças. Quanto maior o problema, mais complexo será o conteúdo necessário para confrontá-lo e mais difícil será gerenciar mudanças com eficácia.
· Tempo disponível para as mudanças – horizontes de prazo mais curto incluem aumentar o número de mudanças ou componentes de mudança que precisam ser considerados simultaneamente. Em geral, quanto menor o horizonte do prazo, maior a complexidade do processo de mudança, já que mais fatores críticos devem ser levados em consideração ao mesmo tempo.
· Velocidade da mudança – quando muitos problemas de mudança devem ser levados em conta em um curto período de tempo, a “velocidade da mudança” é alta. Geralmente, quanto maior a velocidade, maiores os custos ou problemas associados com o processo. Uma alta velocidade, normalmente está associada com um baixo índice de sucesso na gestão de mudança.
O especialista ressaltou que até mesmo o sucesso estratégico pode criar e alimentar vários obstáculos relacionados à mudança. E finalizou apresentando sete medidas para reduzir a resistência às mudanças:
1. As pessoas envolvidas precisam sentir que a mudança é algo importante, que partiu delas – não que foi imposta por outros.
2. A mudança tem de ter o apoio dos escalões superiores da organização.
3. As pessoas vêem a mudança como algo que reduz, não aumenta, as dificuldades no trabalho.
4. A mudança é consistente com os valores das pessoas.
5. As pessoas percebem que sua autonomia e segurança não estão ameaçadas.
6. As comunicações relativas à mudança são eficazes e apropriadas.
7. Os incentivos estão efetivamente vinculados à mudança.
CULTURA ADMINISTRATIVA
Um sólido alinhamento da cultura com os métodos de execução promove o sucesso da execução, enquanto o desalinhamento desencadeia sérios problemas.A cultura é determinante e importante, afetando e refletindo os métodos de execução da estratégia. “A cultura é permanente e difícil de alterar. No entanto, de vez em quando, é necessário mudá-la”, declara Hrebiniak, enfatizando que os líderes que estão no comando de uma execução de estratégia precisam entender o que é cultura e como mudá-la. “Não há outra opção quando a meta é fazer a estratégia funcionar”. Na opinião do professor, o maior problema é que os gerentes geralmente não sabem como mudar a cultura com eficácia.
A cultura compreende os principais valores da organização e afeta o comportamento individual e organizacional, bem como afeta o desempenho. Se o desempenho for bom, há um alinhamento positivo da cultura, das metas, do comportamento e dos métodos de reforço. A cultura e seus efeitos não constituem uma estrada de mão única. Para mudar a cultura, não se foque na cultura, é praticamente impossível convencer as pessoas a mudar suas crenças, valores e atitudes. Foque-se primeiro no comportamento”.
Ele explica que mudar o comportamento pode desafiar as normas culturais, e finalmente mudá-las. Quando se muda a cultura, é muito mais inteligente e eficaz se focar na mudança das pessoas, dos incentivos, dos controles e da estrutura organizacional. Essas alterações afetam o comportamento que, por sua vez, proporcionam mudanças na cultura.
“Trazer pessoas novas para a empresa, com idéias frescas e novas capacidades, estabelece as bases para a mudança cultural”.
Revisão da estratégia
Hrebiniak salientou a necessidade de realizar uma revisão de estratégia. Esse processo de revisão é essencial para apoiar o planejamento e o processo de controle, fazendo a estratégia funcionar. Ele destacou que a revisão da estratégia não é um luxo ou uma opção. “Cada organização deve formar sua própria revisão de estratégia para executar essa estratégia com eficácia”.
Uma boa revisão promove a discussão, esclarece a estratégia corporativa e empresarial, ajuda a definir os objetivos relacionados à execução, permite que os líderes testem e compreendam as pessoas com as quais trabalham e facilite a aprendizagem e a mudança organizacionais.
Hrebiniak destaca que é absolutamente importante depois disso é que a organização comemore o sucesso. Os que realizam as coisas devem ser reconhecidos, e o seu comportamento e o resultado dele devem ser reforçados. “Os gerentes devem reconhecer e recompensar os realizadores, os fazedores que contribuem para o processo de execução”, concluiu.
* Alessandra Assad é jornalista especializada em gestão, colunista do www.administradores.com.br, palestrante, professora na FGV Management e autora do livro Atreva-se a Mudar! – Como fazer melhor gestão de pessoas e processos. Artigos de Alessandra Assad: http://www.administradores.com.br/alessandraassad