As Verdadeiras Razões por trás da Pressão para o Retorno Ao Escritório

A maioria das decisões não estão ligadas ao bem-estar e à produtividade dos funcionários, ignorando boa parte dos dados.
Os principais motivos que levam as empresas a exigir o retorno integral ao escritório está influenciada por fatores como política, cultura, opiniões subjetivas e vieses.
Muito tem se falado sobre as mudanças recentes nas políticas organizacionais relacionadas ao local de trabalho e à frequência com que os funcionários precisam estar no escritório.

Por Tomas Chamorro Premuzic na Forbes

Embora muitos profissionais ainda tenham alguma flexibilidade no modelo híbrido, como a possibilidade de trabalhar de casa uma ou duas vezes por semana, e haja variações significativas entre os países, um número crescente de companhias tem exigido o retorno integral ao escritório e manifestado forte oposição às permissões de trabalho remoto, seja de casa ou de qualquer outro lugar.

Em um mundo racional, essa oposição — assim como qualquer decisão tomada pelas empresas — seria baseada na lógica e sustentada por fatos, dados e evidências, não apenas de estudos científicos independentes que comparam o nível típico de moral, desempenho e produtividade em diferentes modelos de trabalho, mas também — e principalmente — em dados internos das próprias organizações.

Graças aos esforços generalizados de digitalização, a maioria das empresas dispõe de uma grande quantidade de dados sobre seus funcionários. Por isso, analisar a relação entre onde, como as pessoas trabalham e o que elas entregam ou produzem deveria ser o antídoto natural para um debate que, de outra forma, se torna estranhamente politizado, emocional e baseado em relatos isolados.

No mundo real, porém, as decisões corporativas sobre onde os funcionários devem trabalhar, assim como muitas outras relacionadas à gestão de talentos e à cultura organizacional, nem sempre são baseadas na lógica, muito menos em dados e evidências. Na verdade, a maioria dos principais motivos que levam as empresas a exigir o retorno integral ao escritório está influenciada por fatores como política, cultura, opiniões subjetivas e vieses — elementos que não estão positivamente ligados ao bem-estar e à produtividade dos funcionários, nem a uma objeção racional ao trabalho remoto ou híbrido. “A maioria” porque, de fato, algumas empresas podem basear suas decisões em dados concretos, mas elas parecem ser exceção e não a regra.

Justificativas

Então, quais são as razões mais comuns por trás da atual tendência de eliminar o trabalho híbrido ou remoto e substituí-lo pelo retorno integral ao escritório? Confira abaixo, sem uma ordem específica.

  1. Acreditam em uma melhor absorção da cultura organizacional
    Muitos líderes acreditam que o trabalho presencial favorece uma cultura empresarial sólida, que, por sua vez, aumenta o engajamento, a lealdade e a retenção dos colaboradores. Ao estar no escritório, o argumento é de que os funcionários se imergem automaticamente nos valores, normas sociais e interações informais da empresa, tudo isso contribuindo para a coesão cultural. Assim, estar no escritório:

Fortalece o vínculo entre as equipes por meio de experiências compartilhadas.
Reforça os valores organizacionais por osmose.
Cria oportunidades de mentoria e desenvolvimento de carreira por meio de interações espontâneas.
Embora isso possa ser verdade, também há contra-argumentos a considerar. A cultura de uma organização não depende necessariamente de um espaço físico. Ela pode ser cultivada remotamente por meio de esforços intencionais. Forçar os colaboradores a estarem em um ambiente que não se alinha ao seu estilo de trabalhar pode reduzir a satisfação no trabalho. Além disso, há o risco de exclusão, pois alguns funcionários, como cuidadores e pessoas neurodivergentes, podem ter dificuldades com as rígidas expectativas de estar no escritório.

Vale destacar que só porque alguém está no escritório, não significa que essa pessoa se identificará com a cultura ou sentirá que pertence a ela. Segundo dados de engajamento da Gallup, a maioria das pessoas não se sente assim. Na verdade, o engajamento e o desempenho são, na maioria das vezes, previstos não pelo local de trabalho, mas pela qualidade e competência dos gerentes diretos.

  1. Não conseguem monitorar produtividade
    Muitos gerentes têm dificuldades em avaliar a produtividade com base apenas nos resultados. Um paradoxo fundamental da vida organizacional moderna é que, quanto mais alguém é pago para fazer o que faz — e quanto mais qualificado e sênior se supõe que seja — mais difícil é saber se essa pessoa é boa no que faz. Isso se estende a líderes políticos e chefes de Estado, explicando o debate eterno sobre se um incumbente é competente ou não, um debate no qual lealdades ideológicas e tribais podem superar os fatos e a realidade.

Em um mundo em que as quantificações objetivas de valor agregado são normalmente eclipsadas pela política de reputação, gestão para cima e fingir que está bem, os gerentes preferem confiar em pistas visuais, como ver os colaboradores em suas mesas, para avaliar se o trabalho está sendo feito.

A presença física no escritório permite que os gerentes forneçam feedback em tempo real e reduz a incerteza sobre a disponibilidade dos funcionários — idealmente, os gerentes também estão no escritório quando forçam os colaboradores a estarem lá, mas isso não deve ser dado como certo. Além disso, permite que gerentes menos experientes se sintam no controle.

Dito isso, também há alguns pontos negativos a considerar, como o fato de que presença não é igual a produtividade, já que os colaboradores podem se engajar em trabalho performático em vez de produzir resultados significativos. O excesso de dependência da visibilidade pode levar ao microgerenciamento e desengajar os colaboradores que sentem que não são confiáveis o suficiente para trabalhar de forma autônoma. O viés de proximidade também entra em cena, pois os gerentes tendem a avaliar os colaboradores de forma mais positiva se eles estão no escritório.

  1. Precisam justificar o custo de um escritório
    Muitas empresas têm contratos de aluguel de longo prazo para escritórios que representam custos significativos, enquanto outras investiram ainda mais na compra de imóveis comerciais. Para justificar essas despesas, os líderes insistem que os colaboradores usem o espaço. Em resumo, trazer as pessoas para o escritório maximiza o retorno sobre o investimento em imóveis existentes, fornece aos funcionários acesso a comodidades do escritório e pode criar um senso de justiça se todos forem obrigados a estar presentes.

Ainda assim, os líderes organizacionais devem considerar que uma decisão financeira não deve ditar os arranjos de trabalho se isso impactar negativamente a produtividade e o bem-estar dos colaboradores. Esse argumento pode gerar ressentimento se os funcionários sentirem que estão se deslocando apenas para satisfazer um custo, já que haverá o entendimento de que a organização valoriza mais seus imóveis do que seu talento ou capital humano.

Além disso, a inflexibilidade nos contratos de locação pode impedir as empresas de adotarem modelos híbridos ou remotos, que podem ser mais adequados para o negócio. Os colaboradores não devem pagar o preço por um planejamento ou alocação estratégica de custos malfeito. A empresa global de imóveis CBRE relata que as taxas de vacância de escritórios aumentaram significativamente, com muitas empresas tendo dificuldade em justificar suas necessidades de espaço pós-pandemia.

  1. Desejam facilitar a colaboração e o trabalho em equipe
    O trabalho presencial facilita uma colaboração mais fácil e espontânea, reduzindo a fricção para agendar reuniões virtuais e permitindo o brainstorming informal. Ele aumenta a probabilidade de resolução de problemas e inovação por serendipidade, especialmente através dos encontros espontâneos no escritório que aceleram o compartilhamento de informações e a propagação de boas ideias. Além disso, torna mais fácil para as equipes realizarem interação rápida e feedback em tempo real, fortalecendo os relacionamentos interpessoais, o que pode melhorar o trabalho em equipe.

Dito isso, há algumas nuances e ressalvas importantes a considerar. A colaboração ainda pode ser eficaz remotamente, com as ferramentas e práticas corretas. A colaboração online impulsiona o compartilhamento de conhecimento e a cooperação além do viés de proximidade e dos silos de grupo, favorecendo a diversidade e inclusão. Além disso, ambientes de escritório podem, às vezes, ser distrativos, reduzindo o trabalho profundo, especialmente para introvertidos e pessoas neurodivergentes.

Também se supõe que todo trabalho se beneficie da colaboração, quando algumas funções exigem mais foco independente. Na verdade, quanto mais o seu trabalho exige resolução de problemas, pensamento analítico e atenção aos detalhes, melhor é não estar no escritório. Um estudo de 2022 da Microsoft descobriu que, embora a colaboração presencial tenha vantagens, modelos híbridos também apoiam o trabalho profundo e a flexibilidade.

  1. Querem reforçar a estrutura hierárquica tradicional
    Alguns gerentes acreditam que a presença física reforça a autoridade e a estrutura no local de trabalho, permitindo que a liderança mantenha maior controle sobre a força de trabalho. Com certeza, ser capaz de forçar as pessoas a voltar ao escritório é, em si, um forte indicador de poder sobre elas, então gerentes e líderes sedentos de poder tendem a se aproximar dessa ideia.

Há também alguns benefícios esperados ou percebidos ao exercer seu poder para trazer as pessoas de volta ao trabalho. Isso cria uma distinção mais clara entre liderança e colaboradores, permite supervisão direta dos funcionários juniores, pode reduzir a resistência à autoridade e é uma opção menos complexa, potencialmente “mais justa”, do que permitir que algumas pessoas evitem o escritório por cargo, patente ou política, enquanto força outras a voltar.

No entanto, existem alguns riscos potenciais. Uma abordagem rígida e de cima para baixo pode sufocar a criatividade e o engajamento. Os colaboradores podem sentir que estão sendo tratados como crianças, em vez de profissionais de confiança. Além disso, as estruturas hierárquicas estão se tornando obsoletas em favor de culturas de trabalho mais ágeis e orientadas para resultados. Pesquisas da McKinsey sugerem que organizações hierárquicas estão com dificuldades para se adaptar às expectativas modernas no local de trabalho.

  1. Defendem o aprendizado por observação e interação
    Funcionários juniores, especialmente os novatos, se beneficiam do aprendizado ao observar e interagir com colegas experientes. Estar fisicamente presente no escritório acelera esse processo, os ajuda a se aclimatarem mais rapidamente e oferece oportunidades de avanço da carreira por meio da visibilidade.

No entanto, também é provável que oportunidades de aprendizado ainda possam ser projetadas em ambientes de trabalho remotos por meio de programas estruturados de mentoria. Alguns funcionários podem não prosperar em um ambiente no presencial e precisar de treinamento mais formalizado. Além disso, nem todo trabalho exige orientação contínua e prática. Um relatório da LinkedIn Learning destaca que as empresas precisam adaptar suas estratégias de aprendizado e desenvolvimento para o trabalho híbrido e remoto. Caso contrário, podem muito bem forçar as pessoas de volta ao escritório.

  1. Acreditam no “poder” do presencial
    Alguns líderes acreditam que, após um longo período de trabalho remoto, como ocorreu durante a recente pandemia de Covid-19, trazer os funcionários de volta ao escritório irá restaurar a energia, motivação e o senso de pertencimento que podem ter diminuído ao longo do tempo. De acordo com essa visão, a obrigatoriedade de retorno integral ao escritório pode permitir que os funcionários se reconectem com colegas de maneira significativa, aumentar a autoestima por meio de interações sociais e eventos presenciais, e ajudar a reconstruir o engajamento de funcionários que possam se sentir isolados.

No entanto, as organizações devem considerar que nem todos os funcionários querem retornar e mandatos forçados podem prejudicar a autoestima em vez de melhorá-la. Se o ambiente do escritório era tóxico antes, trazer os funcionários de volta não resolverá necessariamente os problemas culturais subjacentes. O trabalho híbrido pode oferecer um melhor equilíbrio entre conexão e flexibilidade. Um estudo do relatório “State of Remote Work” da Buffer mostra que os funcionários valorizam a flexibilidade e estão mais engajados quando têm escolha sobre seu ambiente de trabalho.

  1. Desejam motivar demissão voluntária
    Embora provavelmente não admitam, algumas empresas usam mandatos de retorno ao escritório como uma estratégia para reduzir a quantidade de funcionários sem recorrer a demissões caras. Ao tornar o ambiente de trabalho menos flexível, elas forçam os colaboradores — especialmente os que têm boas alternativas de emprego — a pedirem demissão voluntariamente, o que reduz os custos com indenizações. Isso pode ser benéfico, já que reduz os custos com folha de pagamento sem os danos à reputação das demissões, diminui a necessidade de conversas difíceis sobre gestão de desempenho e garante que os que permanecem estejam mais dispostos a cumprir as políticas da empresa.

Ainda assim, essa estratégia pode ter efeitos negativos, como a perda de talentos valiosos em vez de funcionários de baixo desempenho, o prejuízo à marca do empregador, o que dificulta futuras contratações, e a diminuição da autoestima entre os colaboradores restantes, que veem seus colegas deixando a empresa. Pesquisas recentes do National Bureau of Economic Research sugerem que a rotatividade voluntária aumenta quando os funcionários enfrentam condições de trabalho mais rígidas pós-pandemia, especialmente quando outras empresas ainda oferecem opções de trabalho híbrido.

  1. Querem reter apenas pessoas leais
    Alguns líderes veem os mandatos de retorno ao escritório em tempo integral como uma forma de filtrar funcionários que não têm um forte compromisso com a organização. Eles acreditam que aqueles que realmente se importam com a empresa e suas carreiras irão cumprir, enquanto os menos envolvidos irão sair. Essa abordagem trata o trabalho presencial como um símbolo de lealdade e ambição. A justificativa para essa abordagem é que os mandatos de retorno ao escritório podem fortalecer a força de trabalho restante com indivíduos totalmente comprometidos, estimular uma cultura de trabalho que prioriza dedicação e sacrifício, além de criar um processo de seleção natural, onde apenas os funcionários mais motivados permanecem.

No entanto, também é verdade que isso pode criar uma cultura tóxica de presença, onde os colaboradores sentem pressão para ser vistos, em vez de se concentrarem nos resultados. Caso concorrentes ofereçam maior flexibilidade, é possível que eles consigam atrair os melhores talentos. Alguns, com o intuito de não perderem seus trabalhos, podem começar a fingir compromisso e lealdade. Pesquisas da McKinsey mostram que funcionários que se sentem forçados a trabalhar sob condições rígidas têm mais chances de se desengajar e buscar outras oportunidades de emprego.

  1. Nunca acreditaram no trabalho híbrido
    Muitas empresas foram forçadas a permitir o trabalho remoto durante a Covid-19, mesmo que nunca tivessem apoiado essa modalidade. Depois que as pressões externas diminuíram, elas ansiaram pela volta do modelo pré-pandemia. Afinal, o apoio temporário ao trabalho híbrido não foi uma decisão estratégica, mas uma necessidade. Assim como as pessoas, as organizações tentam rapidamente retornar ao status quo anterior quando são forçadas a mudar.

Essa inércia ou energia para voltar ao antigo modelo explica a crença de muitas organizações e líderes de que trazer as pessoas de volta ao escritório em tempo integral restaura um senso de normalidade para os líderes. Para eles, isso simplifica as operações, elimina as complexidades de gerenciar equipes híbridos e se alinha com a visão da liderança sobre a eficácia do ambiente de trabalho.

No entanto, esse pensamento ignora as lições aprendidas durante a pandemia sobre produtividade e flexibilidade. Como consequência, isso pode desmotivar funcionários que construíram suas vidas em torno do trabalho remoto. A ação também pode ser vista como uma quebra de confiança se os funcionários acreditaram que o trabalho híbrido seria uma opção permanente.

Medir produção é o mais recomendado

Embora algumas companhias tenham sucesso em reforçar — ou impor — a sua cultura de trabalho desejada, muitas correm o risco de desmotivar os funcionários, prejudicar o engajamento e perder talentos para empregadores mais flexíveis. Em muitas situações, é importante entender a diferença entre se beneficiar de trazer as pessoas de volta ao escritório e simplesmente conseguir fazer isso por conta do status, poder, participação no setor ou enfraquecimento de ofertas alternativas no mercado.

É certo que existe algo ilógico na ideia de que os mesmos funcionários que são considerados pela gestão como insuficientemente motivados para serem produtivos quando trabalham de casa, de alguma forma, se tornarão realmente engajados e produtivos se forem forçados a voltar ao escritório, contra a sua vontade, sem uma explicação lógica, incluindo evidências de que eles podem alcançar níveis mais altos de produtividade estando no escritório em tempo integral.

Se eles não saírem — o que dependerá das condições de mercado, da economia e da disponibilidade de alternativas híbridas —, provavelmente irão fingir que estão trabalhando de forma produtiva, assim que voltarem ao escritório. Caso façam isso bem é possível que os líderes se sintam satisfeitos, ao invés de pensarem que essas pessoas não fazem nada no home office, já que não há porque encenar trabalho, se ninguém está vendo.

Um resultado mais positivo, no entanto, poderia ser que apenas os funcionários mais comprometidos e leais permaneçam, tornando os mandatos de retorno ao escritório uma espécie de teste de devoção ou fidelidade — como renovar os votos, demonstrando disposição para enfrentar dificuldades. Em um mundo ideal, as empresas se destacariam em medir a produção, o que os funcionários realmente entregam e o valor que criam, eliminando a necessidade de focar tanto em gerenciar ou monitorar entradas, incluindo onde as pessoas trabalham.

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