A importância dos sistemas de gestão ao criar uma cultura de trabalho híbrido
Os sistemas de gestão reforçam os pontos mais valorizados pela empresa. Ao adotar o trabalho híbrido, é preciso entender as funcionalidades de cada sistema e planejar adaptações necessárias
Original de Liliane Moura na revistahsm.com.br
Nos últimos dois anos, o home office deixou de ser algo limitado a um grupo seleto de trabalhadores. Mas, ao contrário do que o isolamento social fez parecer, o contingente de profissionais remotos não foi tão grande no Brasil.
Entre maio e junho de 2020, a modalidade alcançou apenas 10% dos trabalhadores – algo como 9 milhões de pessoas, conforme um estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). Em novembro do mesmo ano, última referência disponível, o contingente de profissionais remotos caiu para 8,7%. Agora, com a economia reaberta e boa parte da população vacinada, a pergunta que fica é: o trabalho remoto continuará?
Não necessariamente. É claro que muitas vagas serão adaptadas ou preenchidas de acordo com a modalidade – até porque, no Brasil, o trabalho remoto já é regulamentado na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mas o que os estudos indicam, na verdade, é a popularização do trabalho híbrido. Nele, parte acontece presencialmente no escritório e outra parte a distância, seja em casa, na praia ou no coworking.
A ideia que prevalece entre os departamentos de RH é a combinação do melhor dos dois mundos: oferecer uma gestão de trabalho híbrida que mantenha o principal benefício que os funcionários associam ao modelo remoto (autonomia e flexibilidade para gerenciar o tempo pessoal e em família) e neutralizar a principal desvantagem (perda da conexão presencial). “No 100% home office, o colaborador perde parte do contato com a cultura da empresa. É importante ter o momento de interação, de troca informal, como na fila do almoço ou na pausa para o cafezinho”, diz Lilian Kac, diretora de cultura, gente e gestão do grupo Profarma, que atua nos segmentos de distribuição de remédios e varejo farmacêutico.
Segundo Kac, que tem 25 anos de carreira na área de RH, o momento pede equilíbrio entre liberdade e controle. Afinal, os colaboradores já não aceitam trabalhar em um ambiente muito rígido. Uma pesquisa da EY, divulgada em maio de 2021, mostrou que mais da metade (54%) dos entrevistados – 16 mil trabalhadores de 16 países – estariam dispostos a sair do emprego no pós-pandemia, caso a empresa não oferecesse algum nível de flexibilidade. O que não significa dispensar a prestação de contas.
Além da autonomia, o colaborador precisa de uma gestão que o guie para a cultura da empresa. Ou seja, que apresente as regras do jogo, faça um acompanhamento e forneça feedback. Tudo isso por meio de uma comunicação transparente e acessível. Daí a importância dos sistemas de gestão da cultura híbrida.
Sistemas de gestão de times híbridos
Os sistemas de gestão – processos de recrutamento, desenvolvimento organizacional, gestão de performance, gestão de talentos, tomada de decisão, ritmo operacional, CRMs, análise financeira, entre outros – são responsáveis por enviar aos colaboradores mensagens que incluem os pontos mais valorizados pela companhia. Ao adotar trabalho híbrido, é preciso entender as funcionalidades de cada sistema e planejar as adaptações necessárias – para que não se limitem a meramente viabilizar o novo modelo, mas também contribuam para o fortalecimento da cultura organizacional.
Segundo o white paper Gestão da cultura em um mundo híbrido, produzido em 2021 pela Walk the Talk, existem pelo menos três sistemas que as organizações devem enfatizar ao gerenciar uma cultura de forma remota.
1. Recrutamento e integração de novos funcionários:
Como são poucas as oportunidades de troca informal entre colegas – é o caso da pausa para o cafezinho –, é importante que as empresas atraiam o tipo certo de pessoas. Depois, é preciso estratégias para criar vínculos que desenvolvam lealdade à empresa. O gestor pode incluir a equipe no recrutamento para criar um sentimento de comunidade logo no início. Também pode esmiuçar a cultura organizacional – apresentá-la, dando exemplos de pessoas que a ilustrem.
Na Swile, multinacional francesa de worklife experience que opera no Brasil com benefícios flexíveis, a cultura organizacional está presente desde o processo de recrutamento. “A intenção é ter pessoas com afinidade com a forma de fazermos as coisas. Obviamente, não queremos que sejam um clone, afinal, elas chegam até nós como são. Mas temos valores, e queremos pessoas que se identifiquem com eles”, explicou Martha Santos, people experience partner da empresa, em entrevista recente à HSM Management.
Para facilitar o processo de adaptação, o onboarding do novo colaborador com o líder contratante também pode incluir a interação com um “padrinho”. Trata-se de um mentor ou parceiro que acompanhará o novato ao longo dos primeiros dias na empresa. A estratégia é adotada na Swile e também na GitLab. Especializada em desenvolvimento de software, a empresa criou tutoriais em vídeo para os membros da equipe, ferramentas que permitem colaboração assíncrona e um manual do funcionário que ajuda os novos contratados a entender os valores, sistemas operacionais e outras políticas.
Especialistas garantem que a construção de um relacionamento saudável, desde o início, reduz drasticamente o turnover e aumenta a produtividade.
2. Gestão de performance e reconhecimentos:
Em um ambiente híbrido, pode ser mais difícil ter conversas sobre performance no instante em que as coisas acontecem. O que significa que é ainda mais importante ter pontos de contato regulares com os colaboradores. Pequenos atos de reconhecimento e recompensa ajudam a manter a motivação e o engajamento. Reconhecer pessoas com alto desempenho também é uma ótima estratégia para reter talentos.
Outra coisa interessante quanto à performance: é preciso ser claro quanto aos parâmetros de trabalho. Isso inclui informar até onde vai a autonomia do colaborador, ser claro quanto a prazos de entrega e ainda mais explícito ao comunicar tarefas. Segundo uma pesquisa do Gartner, durante períodos de crise o desejo de reconhecimento dos funcionários aumenta em cerca de 30%. Por isso é de suma importância a empresa celebrar e reconhecer as conquistas dos colaboradores.
O líder também pode incentivar os membros da equipe a reconhecerem os feitos dos colegas. Crie espaço nas reuniões, estabeleça um momento semanal do tipo “histórias de sucesso”. E não esqueça de dar feedback no tempo certo. Pequenos erros podem se agravar mais rapidamente no modo remoto.
3. Gestão de talentos:
Aumentar a capacidade de descobrir e desenvolver talentos é cada vez mais importante, à medida que as pessoas estão menos visíveis à liderança. O contexto pode ser positivo ao colaborador que gosta de trabalhar mais à vontade. Mas também pode prejudicá-lo. Já diz o velho ditado: quem não é visto, não é lembrado. Pesquisas indicam que as chances de promoção são menores para os que trabalham remotamente quando comparados aos que frequentam o escritório com assiduidade.
Nesse sentido, a empresa pode criar um sistema onde haja oportunidades para que as pessoas participem de novos projetos e de diferentes formas, para que sua performance seja medida em contextos e com pessoas diferentes. Pessoas com grande potencial possuem forte desejo de inovar e se aperfeiçoar. Compartilhe seus desafios e problemas, busque ideias de várias fontes e desenvolva equipes apaixonadas por resolver problemas.
Vendo de outro prisma, a gestão humanizada tende a marcar a era do trabalho híbrido. Além da flexibilidade do modelo de trabalho, ela se caracteriza pela promoção do bem-estar e pela concessão de benefícios flexíveis. Como sugere o nome, os benefícios flexíveis possibilitam que o colaborador tenha mais liberdade de escolha dentro das vantagens oferecidas pela empresa. Esse movimento ainda é incipiente no Brasil.
No entanto, o Guia Nacional de Benefícios 2021, estudo produzido pela Swile e pela Leme Consultoria, aponta que mais da metade (53,6%) das quase 1,2 mil empresas entrevistadas têm interesse em oferecer tais vantagens, sinal de que o atributo da flexibilidade nos regimes de trabalho – seja remoto ou híbrido – começa a se consolidar na estratégia das empresas. Esse movimento também demonstra o amadurecimento da gestão e o reconhecimento da potência dos benefícios flexíveis na atração e retenção de talentos.
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